sábado, outubro 16, 2010

As curas do doutor Fréderick

Fazia tempo que Norma sentia estranhos arrepios pelo corpo. Como uma febre repentina, que surgia especialmente quando tirava a roupa pra dormir, ou na hora em que ia tomar banho.

No princípio, achou que fosse uma gripe mal curada, querendo dar o ar de sua graça, no momento em que deixava o corpo exposto ao frio. Preocupada ao extremo com sua saúde, não demorou na visita ao médico. Poderia ser um princípio de pneumonia, imaginou angustiada.

Após recomendações de tirar a febre de hora em hora, durante 20 dias seguidos, tranquilizou-se, pois a temperatura se mantinha nos 36,8 graus. Mesmo assim insistiu em fazer alguns exames, ainda que a contragosto do doutor.

Nada? Nada mesmo?

Nada. "Sua saúde está perfeita, como sempre. O que a senhora precisa é cuidar mais de sua cabeça."

Nada. Norma não entendia por que os calafrios continuavam. "Parece uma mão muito quente, percorrendo minhas costas", disse ela ao marido que, acostumado com as constantes queixas de dores no corpo ou seguido mal estar, lhe recomendou um centro espírita. Mesmo sabendo que poderia ser execrado pela atitude, devido a extrema religiosidade de sua mulher.

"Virgem Maria! Deus nos salve! Não fale nunca mais nestas coisas do diabo, Horácio!"

Uma semana... Duas... Norma seguia a sua vida de mãe e dona de casa perfeita. Agora com novos ingredientes, além dos terços e temperos. Os calafrios evoluíram pra visões. Homens, mulheres, crianças com aventais brancos... nãããoo... dava pra distinguir bem. Mas ela sabia que alguma coisa a perturbava. Até algumas vozes, chegou a ouvir. Procurou a ajuda de uma amiga psiquiatra.

"Pela psiquiatria, quando alguém fala com pessoas que apenas ela vê, significa algum tipo de esquizofrenia", disse ela. "Agora, se você vê pessoas que existem, pode ser uma percepção sensorial, ou seja, seus olhos receberam estímulos do ambiente, que foi convertido em código, como se fossem sinais elétricos, para que o cérebro possa interpretar como uma presença naquele ambiente."

Ao invés de esclarecer, Norma se confundiu mais com a explicação da amiga. Resolveu relaxar. Chegou em casa, preparou um chá. Pegou uma revista. Que nem abriu. Mudou de idéia. Decidiu escrever. A mão deslizou, quase sem controle.

"O amor verdadeiro não morre. Só quem já sentiu um dia este sentimento, sabe do que estou falando. Tive várias mulheres, mas só amei uma, em segredo, separada pelo destino. Preciso agora reparar o meu erro e doar-me o máximo possível, para salvar as pessoas enfermas do coração. My name é Fréderick August Johnson. Sou um médico psiquiatra inglês, desencarnado em outrubro de 1976. Preciso de sua colaboração, para espalhar amor pela terra. Até mais."

O barulho da chave do marido, ao abrir a porta da casa, horas depois, fez Norma despertar do estado de letargia em que se encontrava. Sentiu uma estranha alegria e pensou em dividir o sentimento com o companheiro. Mas achou prudente silenciar. Pelo menos naquele momento. rasgou a folha do caderno, rapidamente. E o colocou no bolso da calça jeans.

Não dormiu a noite toda. Não conseguia esquecer a revelação. Pela sua crença, sempre admitiu a vida após a morte. Por quatro vezxes foi ao banheiro, com o bilhete na mão. Não, não foi o bom português do médico que lhe deixou intrigada - "espíritos devem ser poliglotas" - se conformou, mas sim, o ano da morte. Aquela data lhe dizia alguma coisa, que ela não conseguia descobrir, no momento. O que fazer agora?

"Você é médium! Sempre soube disso", gritou pelo telefone, Yolanda, a amiga espírita, com quem não falava há anos. Recém havia servido o café da manhã, como mandava o figurino, os três sucos de laranjas frescas, feitos na hora e as torradas quentinhas, de todo dia, para o marido e os dois filhos rapazes.

Se arrumou e saiu apressada pra casa de Yolanda. De lá, pro centro esotérico, conhecido da amiga. Mais uma sessão e Norma acabou descobrindo, através de outros médiuns presentes, que Fréderick August Johnson foi grande médico inglês, que fez sua vida na Argentina e curou inúmeros pacientes de câncer. Isto no século dezzzz...oi...to. "Mas por que ele me comunicou ter morrido em 1976?" - cobrou indignada, já íntima do doutor.

"Pode ter havido um ruído de comunicação. Isto é normal no primeiro contato com espíritos desencarnados", revelou a amiga. "Neste ano... e... mês... pensou com seus botões e quase não querendo pensar, foi a morte do Guto, o0 seu vizinho bonitão, pelo qual sentia enorme atração. Mas isto, Norma guardou pra si. Se sentia envergonhada e embaraçada ao misturar sexo com coisas sagradas.

Dúvidas à parte, Norma ia vivendo com seu destino, ou melhor, com seu companheiro espiritual, o marido e os filhos, na mais santa paz e felcicidade. Nunca havia se sentido tão bem, nos seus quase 50 anos de vida. olhos brilhantes, sorrisos constantes. O bem estar era notado por todos, que perguntavam o motivo de tanta mudança.

"Segredo", respondia sorrindo.

"Não fale a ninguém, que você se comunica comigo", foi o pedido feito um dia, por seu psicografado. O encanto pode quebrar, ninguém vai entender e o contato falhar."

"Deeeeus me livre disso", falou Norma baixinho, quase em tom de suspiro, enquanto se preparava pra tomar o terceiro banho do dia. Era nestes momentos que se sentia no auge. Uma espécie de catarse divina. A energia que tanto a incomodava em outro tempo, percorrer livre, leve e solta, por suas entranhas.

"O verdadeiro encontro de alma e espírito," dizia a mais recente cantada, oops, psicografia do doutor Fréderick August Johnson.

terça-feira, setembro 28, 2010

Arrastão da imprensa!

Ah, liberdade! Quantos crimes se cometem em teu nome...
Exalando ódio por todos os lados, os jornalões e tevesonas brasileiras, comandada por tradicionais famílias e incomodada com a extensão paritária do orçamento do governo para a publicidade, resolveu bombardear o bom senso de vez!
Num ataque de histerismo e fúria perdeu as estribeiras a ética, a vergonha e elegância. Apelou pra panfletagem.
Que papelão!
Não querendo comparar, mas já comparando, num remoto passado, quando uma avalanche conservadora igual a esta ocorreu, tóiiiiim, o país sofreu um golpe de estado! Sob suspeita de instaurar uma república sindicalista e abrir terreno para o regime comunista... E por 25 anos vivemos na escuridão da censura!
Viva a liberdade!
Afinal, que mais querem os barões da mídia. Só em um país democrático, jornais podem ridicularizar e enfiar o dedo na cara do presidente da república. Chamá-lo de fascista. De bêbado. De analfabeto. De estuprador. De trapalhão.
Uns fanfarrões...
Se falam com um dirigente da nação desta forma, imagine como o fazem com o garçom, com a mãe, com o repórter?
Se acham.
Brincando de aitolás, inchados pelo poder de influênciar a opinião pública, apelam. E misturam política com religião. O corpo feminino, a sociedade pertence. Candidata que quer matar criancinhas tem que penar no fogo do inferno, bem longe do candidato preferido, bom moço e pobre menino, filho de Maria.
Não demora, teremos uma nova marcha da família. Com deus, pela liberdade! Milhares de senhoras e senhores bem vestidos, carregando cartazes de fora o demônio!
Naquele papo esquisofrênicojaborianoobssessivo, lascam em editoriais: "fiquem advertidos de que tentativas de controle da imprensa serão repudiadas". E se dizem apartidários, independentes e pluralistas.
Burlam o jogo. Escondem as regras, invertem o direito à comunicação previsto na Constituição. Tudo na mais santa paz. Na mais completa liberdade. E tudo bem. Como deve ser.
Informar a população sobre os desmandos do governo é dever da imprensa. Todo mundo sabe. Optar por um candidato é transparente e mais honesto. Todo mundo apoia. Fazer campanha pró ou contra candidatos é abuso de poder. Cadê as vaias? Imprensa livre é saudável. Todo mundo gosta.
Pena que estejam todos de um lado só. E se acham!
Verdadeiros democratas.






















terça-feira, maio 25, 2010

Tempo...tempo...tempo...


Tempo, tempo, tempo... dizia a senhora elegante, muito apressada, ao discar o telefone, enquanto batia nervosamente os dedos de uma mão, bem cuidada, na mesinha ao lado do sofá, em que ela estava sentada, na sala do laboratório clínico de exames. A outra mão, segurava o fone. "Bom dia, Alessandra, quero te passar rapidamente as coordenadas sobre o que você deverá enfatizar na reunião das 10 horas... e..."
Estava à sua frente. Aproveitei pra levantar e tomar um cafezinho. Minha irmã recém tinha sido chamada. Pra fazer dois exames. Senha 2015. O painel já indicava a 2016.
"Bom dia Helena..." (bah, já tinha esquecido a senhora apressada e seu correto portugues). Agora ela estava no celular. Tentei sentar longe, mas não teve jeito. Poucas pessoas no ambiente, o forte volume da voz, então vamo que vamo. -" ... quero te dizer uma coisa, manda a dona Francisca, mas veja bem, com toda a polidez possível, e no momento certo, limpar direitinho a....que ela não fez direito...deixou a persiana... Diz assim: ooooolha a Rosana vai passar por aqui não demora e voce sabe como ela é exigente, examina tudo...
"Oooi, bom dia, eu sou Rosana...quero matricular a minha filha no período entre 12:30 às 13:30, o único horário livre que ela tem... escolhi o seu curso porq...eu entendo... também sou professora de inglês... tenho uma escola também... está perfeito, ela está no 4º ano de medicina... ah, está perfeito... de acordo com meu orçamento... meu marido trabalha na Transfor, que fica na rua aí atrás... e vai poder dar uma carona a ela... excelente!..."
Abri o livro na página marcada. De novo, não tive como não ouvir a secretária se desculpar com Rosana - que foi obrigada a dar uma rápida pausa no celular - pelo atraso do exame. "Então eu vou dar um pulinho no banco do shopping, ah, o tempo..."
Tempo pra ler umas seis páginas, pensei. Na quarta, o toc,toc do salto apressado anunciava. Rosana chegou. Falando ao celular, claro! Sentou ao meu lado. " ... pois é Luana, cheguei há pouco do Rio, acabei fazendo o curso que voce tinha me indicado... muito bom... prensei todo o final de semana... mas foi ótimo... sei que voce está com pressa... liguei só pra te agradecer a gentileza... é merecemos tomar um café juntas... te ligo pra marcar... beijos..."
"Incomodo você?" - me perguntou, já discando e sem se preocupar em ouvir a minha resposta, rebateu: o tempo, o tempo...
"...Bom dia, Marta, quinta-feira tenho uma palestra, vou ter que sair uns 20 minutos antes da aula. Informa para a Maria Alice que ela vai ter que me substituir neste tempo que falta... tudo bem por aí?... ah, me confirma se o jantar é hoje mesmo?..."
Levantei pra tomar água. "Booom dia..." - pelo menos a voz estava um pouquinho mais longe. Vou ficar um tempo por aqui.















segunda-feira, maio 17, 2010

Um fácil negócio

Nas grandes cidades, a abordagem de "prega dores" à pessoas nas ruas é mais discreta. Se limitam à áreas pobres, onde há mais facilidade de concentração de homens e mulheres em dificuldades financeiras e sociais. Pela própria obviedade, os sofredores são mais frágeis de convencimento, tipo, "pior do que está, é impossível, quem sabe sigo este caminho." Acreditar em algo mais, se torna um conforto...
A carência é grande. Daí não ser muito estranho perceber que, em pleno Morumbi, dito bairro nobre de Sampa, há uma espécie de marcação cerrada por zona, dos ditos doutrinadores. (Pra quem não sabe, existe até associação internacional deles). Ainda que discretos, eles sentam em determinados bancos de pontos de ônibus. Conforme a cara do vizinho que sentará ao seu lado, tá eleita a vítima. E pra isto tem que ter muito feeling. Só uma observaçãozinha: já tentou fazer um comentário inocente com um paulista na fila da padaria, por exemplo? A pessoa te olha com cara de voce é louco? Por que tá falando comigo???

Pois bem, dia destes, durante a caminhada, decidi sentar ao lado de uma "presa". Um jovem, aparentando timidez. Por cerca de três minutos, ele ouviu do coroa bem trajado, com jeito de respeitável, a opção de pertencer à Comunidade Evangélica Senhor da Paz Interior. Até chegar seu ônibus, o cara só ouviu. E levou no bolso um impresso com mais informações da seita. E claro, número do registro e cadastro nos órgãos responsáveis.

Fácil assim, porque a mamata é institucionalizada. Não existem requisitos para abrir uma igreja por aqui. Nem um determinado número de fiéis, nem sequer uma linha teológica. Basta uma apresentação da entidade, ou seja que nome se chamar, em forma de documento, para obter a inscrição no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas, o conhecido CNPJ.

Simples assim! Inclusive um, dois, três celulares da Oi, já que tocamos no comercial da dita. Isto porque, o número do CNPJ abre as portas pra tudo: uma conta bancária, com aplicações financeiras, e o que é melhor, sem qualquer tributo, diferente do que uma empresa comum é obrigada a pagar sobre este tipo de operação.

Pela constituição, união, estados e municípios são proibidos de cobrar impostos de templos, independente de cultos. Mas pode cobrar pela prestação de serviços, comprar casas, carros sem pagar Iptu, Ipva e Iss, em nome de seus criadores e dirigentes. Tem mais, se um deles, incluíndo aí, pregadores e sacerdotes forem presos, tem direito a prisão especial.

Um trabalho e tanto, né não?

segunda-feira, março 01, 2010

Sampa no século XXI

A trégua da chuva na cidade é real. O sol escaldante batendo no quarto às 8 da manhã fervente de verão, prenunciava o futuro das horas. O dia abafado confundia realidade e pesadelo. Roque. Buzina. E motor. Tudo ao mesmo tempo. Maurício desliga o som apressado. Como sempre faz ao acordar. Hoje, mais tarde um pouquinho. Respira fundo e se espreguiça devagar. Ri de si mesmo, pela falta de pressa. Ainda bem que a reunião no escritório está marcada para às 11. "Um antiestresse demorado agora", pensou entusiasmado.
Ainda na cama, aperta o controle de abertura das duchas e levanta cantando até a sala de banho.
Como assim? Não tem água de novo? Puxa, mas isto foi ontem... lembrou. Ainda bem que existe a água do refrigerador pra beber. Lavar o rosto...

Café na rua. Em 2 horas, Maurício chega ao trabalho. Se o trânsito de férias continuar calmo.
Foi só um sonho. A realidade do engarrafamento desmonta previsões, na cidade imprevisível. E o atraso, rotina.

Melhorou no retorno pra casa, às 10 da noite. Mas ainda sem água no prédio. "O condomínio comprou 4 mil litros de água, pra abastecer a caixa, mas a empresa teve que cancelar, devido a alta demanda e a falta de caminhões-pipas", informou o porteiro.

Maurício deu a volta e foi parar num hotel. "Amanhã é um novo dia. Tudo será diferente", pensou.

Teve que ficar mais tempo fora de casa. O abastecimento foi regularizado 2 dias depois. Uuufa!

Nova semana! Um revigorado Maurício desliga o som apressado. Como sempre faz ao acorrr...darr... Pe-e-erai... Recapitulando. "É impressão, ou tô sonhando? Ah, o som estragou..." imaginou.

Liga o botão do banho e levanta cantando." Pooorra, de novo, faltou luz!!! Deve estar chovendo... Maurício já está escolado. Quando chove em São Paulo é falta de luz na certa! Às vezes 2... 3... 4 horas.

Pra quem tá chegando na maior cidade da América do Sul: daqui à pouco vem o inverno. É melhor a gente se preparar...

sexta-feira, fevereiro 19, 2010

Fantasia de mulher!

Elas subiam a avenida quietinhas, como meninas comportadas. Mesmo assim, chamavam a atenção dos poucos gatos pingados que passavam pelas calçadas da Giovanni Gronchi, na manhã desta terça de carnaval.

Também, nem precisava auê. Rogéria e Marcela - os nomes são fictícios - mas encaixam direitinho às respectivas personagens, esbanjavam breguice. Perucas loiras, vestidos brilhantes, decotes extravagantes, deixando à mostra seios postiços, cercados por uma montanha de pêlos escuros.

E tênis! Claro, os sapatos de saltos deveriam estar guardados nas mochilas que carregavam às costas.

Estranha mania esta de homens se vestirem de mulheres no carnaval. De todas as classes e profissões. Suspeitos e insuspeitos. Respeitados pais de família.

"Meu vizinho é um machão daqueeeeles, vive proibindo a filha de usar minissaia, mas nesta época, é o primeiro a aderir", me disse o porteiro do prédio. Voce já se vestiu? - perguntei. Não. Mas se fosse pra um bloco, quem sabe? - respondeu.

Na teoria de um amigo psicólogo a fantasia de mulher - nunca comportada, mas sempre extravagante e sensual - libera outras fantasias...

A verdade é que todo o homem tem a sua porção mulher. Mesmo aqueles que não concordam com Gilberto Gil. Assim como toda a mulher tem sua porção homem. E todos demonstramos isso, ainda que inconscientemente, em algumas horas de nossas atividades, no trabalho, no esporte, no trânsito, na cama.

Mas que diabos, no carnaval só os homens se liberam total? Ou as mulheres são muito tímidas e retraídas pra invadir o guardarroupa dos maridos e companhia ilimitada na festa da liberação? Ainda não vi mulher fantasiada de homem, no carnaval. Se isto acontece, acho que são poucas.

sexta-feira, janeiro 15, 2010

Uma paródia de Drumond em homenagem aos coleguinhas...

E agora José?
O primeiro ano passou. O segundo ano passou. O terceiro ano terminou e quando você viu, seu deadline sumiu. Acabaram com a tua faculdade.
De jornalista, voce virou cozinheiro!
De que adiantou, José, voce batalhar, passar horas da madrugada estudando, de dia no cursinho, gastando metade do seu salário pra enfrentar o vestibular?
Veio a aprovação. Voce chorou como criança. Depois pagou mais do que a metade do seu salário. Matrícula. Primeiro ano. Segundo. Terceiro...
O quarto virou ficção, José. Pauta furada. Matéria censurada. Rainha da Inglaterra. Receita de bolo.
O quarto ano se foi. E o diploma...
O diploma não vale. O emprego não há.
Você está sozinho José. Os jornais te reprovam. Barrigam com a "tua" preferência. Abafam a tua voz. Você não tem panela. Quem mandou estudar? Só voce ficou. E agora?

Quer ir a fonte, a editoria. A Lei de Imprensa. Mas lei de imprensa não há, José. E as mesas dos bares estão todas vazias...

Se você escrevesse. Se voce tivesse espaço. Se voce cavasse. Se voce apurasse. Se voce garimpasse. Se voce copidescasse. Se voce bebesse José!

Mas voce não bebe! Voce não tem dinherio José.

Voce com seus códigos de ética. Com seus manuais de redação. Com sua psicologia de botequim. Com sua responsabilidade de ouvir os dois lados. Que lados, José?

Tens os códigos nas mãos. Mas e o sentimento do mundo? Cadê José?

Cadê a verdade que orientava suas entrevistas? Cadê o sentimento de liberdade? Cadê o "case"?
Cadê a matéria isenta?
E a tua compreensiva companheira, de cabeça feita, que lhe jurava amor?

Se mandou, José... Com seu amigo diretor.

Tudo passou. Tudo ruiu. Tudo mofou. Amarelou. Página virada. Letras apagadas. Virou off.

Só voce ficou. Incrédulo. Plantado. Com seu sentimento impotente de indignação. Com o estômago revirado pela angústia do fim de um sonho.

Que fazer, José? Morrer?
Mas voce não morre. Voce é duro, babaca José.


terça-feira, janeiro 05, 2010

Liberdade de expressão! Ou texto que jamais seria lido em um jornal...

O costume faz o monge. Ou vice-versa. Ah, a filosofia não vem ao caso, quando o papo é simples e rasteiro. Seguinte: a gente sabe que os jornais nascem com notícias velhas. Notícias que já foram lidas no dia anterior, na web. Pelo menos, pro ainda pequeno público deste país que pode se utilizar do computador. O outro, o maior, não lê mesmo. Ou os R$ 2 e 50 faltam pro ônibus, ou não tem interesse mesmo.

O problema é que estas certezas, chatérrimas de explicar e serem entendidas, especialmente por antigos jornalistas, leitores e companhias limitadas, viram cacoetes, hábitos. O que significa, nem pensar em desistir da leitura diária in loco dos jornais. Sujando bem as mãos de tinta, pra ficar mais gostoso. E pra que não falte nunca - outra neurose jurássica - é bom se resguardar com a assinatura. Quando há a impossibilidade do dito ser entregue, bonitinho na portinha de casa, coisa que sempre acontece no verão de transferências pra praia, aí é que dá mais vontade de ler.

Digo isto, pra explicar, porque, em plena manhã de domingoressaca, me pus em marcha atrás do Estadão pelos lados de um deserto Morumbi, em pleno dia 3 de janeiro. Mas cadê o Estadão? Fui encontrar na terceira banca! E me surprendi com a constatação que eu já desconfiava com os meus botões. Enquanto o Estado de São Paulo e até o populacho Diário haviam sumido, vários exemplares da Folha de São Paulo, a minha queriiiida Folhinha dos áureos tempos de chumbo, sniiiiiiiifando. Parecia chorar, de tão desprezada no suporte de jornais.

O que faz uma ditabranda, pensei ! Se bem que o Estadão também, né...

Bom, continuando... o fato não parece sazonal. "É verdade, faz tempo que a Folha sempre sobra", confirmou o dono da banca. Mas quer saber, Frias, Mesquitas, Marinhos, Macedos, Barros, Saads sempre se garantem", ironizou o jornaleiro.

Um unido e poderoso time de elite! Simples e rasteiro.