terça-feira, maio 20, 2008

Aconteceu no Lami - parte IV - O menino loirinho


Um novo planeta? Uma cena de filme? Um sonho?... Vai ser difícil engolir a realidade desta parte da história das duas, pensava Saly, ainda tensa, na direção do carro. Só neste momento ela percebe que continua em alta velocidade. Que dia é hoje mesmo? Pergunta à Lisa, 20 quilômetros mais devagar, depois de um longo suspiro...
Era domingo. Ainda. Até chegarem à esta conclusão não foi tão fácil assim... O tempo - de terror e alegria - em que passaram naquela chácara, parecia enorme. Uma semana, no mínimo.
Começaram a relembrar. Pelo menos, colocar ordem nos fatos. Na tentativa de um entendimento.
Tudo ainda estava muito confuso, lembrou Saly. "Aquele menino... Tenho certeza da sua existência... eu falei com ele..."

"Deve ter sido muito fumo ou o uísque, meu bem!" Respondeu Lisa.

Saly já tivera muitas alucinações, como consequências das pirações de maconha ou álcool. Ela sabia que desta vez, o consumo fora mínimo, impossível de qualquer anormalidade. Por isto a encucação...
Assim como o menino, haviam os bandidos... Ou será que tudo foi produção de sua cabeça...
Não, um cara, pelo menos, ela tem certeza de sua visão. A Lisa não viu... Ah, mas ela ouviu os passos! E bem reais!

"Lisa, a gente deixou a casa aberta... Tudo ficou lá... lençóis, cobertores, roupas, perfumes, maquilagem... lembrou Saly, ao estacionar o carro na garagem do ap em que moravam. Eram quase dez da manhã. Saly arriscou: vamos voltar lá. Tenho que tirar estas dúvidas. Vou achar o menino, pelo menos!"

Decidiram ir de moto. Por quê mesmo? Nem elas sabiam... Só sabiam que tinham pressa... Por quê?

Só Lisa subiu ao ap pra pegar a chave da moto. "Traz uma cerveja", gritou Saly. Lisa trouxe duas. Colocou o capacete e nem deu o outro pra Saly, porque sabia que ela, como sempre, não usaria. E se mandaram.

Quarenta minutos pro meio dia, mais ou menos, as duas já estavam na frente da chácara. De novo. E com um grande frio na barriga. De novo. Sem qualquer arma. Sem polícia. Sem certeza.

Mas, estranho, a sensação de paz! "Uma paz bucólica", lembrou Lisa.

O cenário era o mesmo que haviam deixado...

O portãozinho de madeira todo aberto. A porta principal também aberta. Mesa posta na frente da casa. Tudo parecia intocado. Sol à pino sobre as árvores centenárias. Nenhuma folha se mexia. Estranho é que havia um vento primaveril. De fora, a impressão que dava era a de uma família que havia recém almoçado, mas seus membros dispersos em algum local da moradia. O silêncio falava. Dava até pra ouvir gritinhos de... crianças... brincando...

Saly e Lisa ficaram paradas por um bom tempo, antes de entrar na casa. Decidiram entrar juntas. E rápido!

Inhéééééééééé... o barulho estridente fez as duas recuarem imediatamente. Era a porta do galpão que batia conforme o vento.

Saly resolveu ir até lá. Tudo igual. Como antes. Passou pelo poço. Ia levantar a tampa, mas sentiu um frio estranho... A caneca pra água continuava no mesmo lugar. Puxou a tampa, espiou o fundo... Outro friozinho no estômago. Fechou imediatamente! Voltou quase correndo e entrou na casa, apressada.

Ajudou Lisa a colocar as roupas e os outros trecos na mochila. Tirou a mesa. Queimaram o lixo. Lavaram a louça. Trancaram a porta da cozinha por dentro. A chave da porta da frente ainda estava no chão. Trancaram a porta. A moto?

Lá no portãozinho de madeira... Ajeitaram tudo e se mandaram. Com uma estranha sensação de que estavam sendo observadas...

No caminho, pararam na casa mais próxima. Saly perguntou pro morador onde poderia encontrar o menino loirinho. Ele riu. "Ué, moça, ele tá aí no colo!"

Saly também riu e comentou pra Lisa: "outro bêbado! Vambora!"