terça-feira, dezembro 11, 2007

Brincadeira de psicopata

Primeiro, foi um inocente scrap no Orkut, registrado com letras maiúsculas, circundado por flores amarelas: finalmente te encontrei. Agora não te perco mais. Te ad muuuuito. O nome, Franci Alves, não fazia parte dos amigos de Vera. Nem adiantou clicar na imagem desfocada. A página estava vazia de perfil, de recados, de fotos, de vídeos, de mensagens, de amigos. Vera deixou pra lá.
Uma semana depois, outro recado de Franci Alves, embaixo de um scrap com flores vermelhas: ainda te amo, apesar de tudo! A página continuava igual. Vazia de tudo. Vera deixou pra lá.
Cinco dias após, Franci Alves volta a atacar: tá bom, já te dei chances demais. Você não ligou, me abandonou. Você vai ver que comigo não se brinca. Desta vez, Vera parou pra pensar: quem será este ser tão doente? Será aquele cara, o... André... meu segundo namorado. Ele tinha um jeito meio estranho... Ou o Rafael, aquele que odiava os gays? Ou a Léia, aquela minha colega de olhar misterioso? Como não tinha nada a temer mesmo, ela deixou pra lá.
Vários dias se passaram. Vera até já havia esquecido as inusitadas ameaças, quando uma foto no orkut a fez estremecer dos pés à cabeça. Ela... Êpa, ela? Mas era ela sim, a roupa dela, o vestido pretinho básico, o cabelo estirado, beijando um homem que ela nunca tinha visto na vida!!!! Como foi possível? O recado estava ao lado da caricatura fantasma na página de Franci Alves.
Montagem... Uma descarada montagem. Foi na semana retrasada. Uma reunião entre amigas, em um café do Morumbi, quando da comemoração do aniversário da Leca. Como pode ser isso, se ela estava sentada do lado da Raquel, o tempo todo?... Deixar pra lá, não dá mais!
Vamos prestar queixa na polícia, meu amor, disse Flávio, o indignado marido de Vera. É montagem rasteira e covarde. Vamos fuder com o cara que fez isto! Só pode ser um débil mental. Denunciar ao Google foi a ação imediata.
Medida inútil, como os dois já previam. Pelo menos, em relação ao bloqueio do remetente. Qualquer pessoa pode inventar um nome e abrir uma página no orkut. E foi só o que deu, no dia seguinte. Desta vez, a foto foi ainda mais provocante. Vera nua, de frente, abraçada com um homem estranho, de costas, no banheiro de um conhecido bar. Casualmente o que ela costuma frequentar com as amigas. Ao lado, outra caricatura com o nome de Auri Alves e a mensagem: lembra desta? Como foi bom...
A surpresa, a raiva, a vergonha não deixaram Vera raciocinar. Imediatamente ela apagou a foto, sem mostrar a Flávio. E desistiu do orkut. "Tá bom, meu amor, eu te entendo, só queria ter visto esta maldita desta foto, pra ver como o cara conseguiu fazer esta maldade?", confessou um já "quase encucado" Flávio.
Um mês depois, a vida de Vera tinha se tornado um inferno. Mesmo sem o orkut. Cada vez mais impaciente, ela não conseguia se concentrar em nada. Por onde andava, tinha a impressão de estar sendo seguida. No carro. Na rua. Até numa reunião de condomínio, quando deu o vexame de sair correndo, mal tinha começado a dita, porque sismou do porteiro, que estava próximo ao salão de festas do edifício. O pior era sua vida sexual com Flávio, que degringolou total.
Mas Flávio se mostrava compreensivo. Até o dia em que chegou às seis horas da manhã em casa, sem avisar e ter desligado o celular. "Porra, você faz o que faz, transa com um cara mau caráter, que te humilha do jeito que quer e ainda vem me cobrar? " - foi a resposta de um irreconhecível Flávio ao questionamento de Vera.
Depois de 12 anos de casamento, dois filhos sadios, a união de Vera e Flávio subiu no telhado. O departamento jurídico do orkut já comunicou à Vera que o número do IP do computador de origem dos recados era de uma lan-house, próxima ao seu bairro. Ela já esperava.